terça-feira, 9 de dezembro de 2008

1º Grupo de Combate - Os Diabos Negros

Da esquerda para a direita, em cima, Domingos, Lourenço, Grabulho, Telo, Avila, Rosário, Cruz, o 1º Cabo Enfermeiro (?), Massena, Moreira, em baixo, Matunguila, Martins, Avelino, Avila, Silva, Almeida, Abrantes, Vaz,Francisco. Com os pés na agua, Teixeira um dos mais famosos guias da Tropas Portuguesas no Norte de Angola (Há algumas imprecisões e omissões.... os anos passam e os nomes esquecem... quem quiser completar ou corrigir agradece-se).

Destacamento do LOGE


Uma Caçada no Destacamento do Loge

A Fazenda do Loge constituía um dos destacamentos da C. Caç. 3482. Ficava situada junto da margem do rio Loge a cerca de 30 Km da Musserra e a uns escassos 15 Km do Ambriz.
A fazenda era constituída por extensos palmares onde trabalhavam centenas de trabalhadores nativos.
A função do destacamento era a de proteger a actividade da Fazenda.As instalações onde os militares ficavam instalados pertenciam à fazenda e possuiam uma qualidade bastante aceitável. Isto fazia com que todos os pelotões gostassem de ali permanecer. Para além do mais era uma zona extremamente rica em caça.
Principalmente pacassas mas tambem javalis e veados. Isto possibilitava uma melhoria significativa do "rancho", já que o montante que se recebia por militar para garantir a sua alimentação, para pouco mais dava do que assegurar uma alimentação pouco mais do que razoável.
Quando se caçava, para além de permitir refeições de carne, sempre preferível às salcichas e ao atum, permitia um maior desafogo para o resto do mês, permitindo por vezes comprar frangos ou cabritos às populações locais, o que possibilitava diversificar a alimentação e constituia motivos de satisfação para todos.Lembro especialmente uma caçada feita pelo 1º. Grupo.
O Alferes saíu com dois Unimogs cada um deles com seis soldados. Os condutores eram o Gregório e o Rolo. Este último, barbeiro na vida civil, era muito cuidadoso na condução o que fazia com que fosse o preferido para conduzir a viatura onde o Alferes se deslocava.
O Gregório natural de Angola, era um autêntico acelera das "chanas". O seu gosto pela cerveja fazia com que eram raras as situações em que conduzia em plenitude dos seus cinco sentidos.
Era de madrugada quando o grupo detectou uma manada de pacassas, a uma centena de metros da picada Loge-Mussera. Os dois unimogs iniciaram de imediato a perseguição atigindo-se velocidades superiores aos 60 Km/hora.
O Alferes abateu uma pacassa ainda jovem, cuja carne se veio a provar ser da melhor que qualquer algum deles jamais havia tido o prazer de comer.Nesse dia foram mortas cinco pacassas, duas delas extremamente corpulentas o que impediu que pudessem ser colocadas nos unimogs à força dos braços. Usaram os guinchos dos unimogs para esse efeito. A estratégia foi a de passar o guincho pelos ramos fortes de uma àrvore, atar a extremidade aos chifres do "bicho" e por fim içá-lo com o guincho de um dos unimogs, enquanto o outro se colocava em posição de a receber. Nesse dia houve carne para toda a Companhia.
Fizeram-se "colunas" para abastecimento de carne. O Alferes conseguiu negociar com o "soba" da aldeia, a troca de uma pacassa por vinte frangos o que fez com que essa caçada ficasse ainda mais memorável.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Operação Lué - 1973


O Alferes A.... reuniu o seu Grupo de Combate umas horas antes de anoitecer no dia anterior à partida. Referiu os detalhes da Operação. A

Operação seria levada a cabo pelo 1.º e 4.ºs Grupos de Combate reforçados por uma secção de GE's de Nanbuangongo.


A Operação iria acontecer na região onde no mês anterior o Alferes V.... havia conduzido uma outra operação sem resultados positivos para as Nossas Tropas. A flagelação intensa das NT pelo fogo inimigo obrigou à nossa retirada. Tratava-se por isso de uma espécie de desforra. Tinhamos recebidos ordens expressas de atacar e destuir o acampamento inimigo que sabiamos existir naquela região, situada entre as povoações do Quixico e do Lué, a cerca de 15 Km do Lué.


Para além das preocupações habituais, nomeadamente o bom estado Radio Racal e do necessário equipamente de primeiros socorros, foi distribuido material de guerra adicional. Contra o que era habitual, levariam o morteiro de 60 mm e cada militar deveria levar consigo uma granada de morteiro.Não deixou de recomendar que seriam necessários todos os cuidados, pois que se trataria por certo de uma das mais perigosas operações que haviam sido concretizadas até ao momento pela Companhia de Caçadores 3482.


Apesar da experiência de todos os militares, quase todos eles com cerca de 18 meses de guerra, sentia-se em todos eles uma certa crispação. Por certo que a sua experiêcia e os seu nervos iriam ser postos à prova.Poucos dormiram durante a noite e certamente todos eles se recordaram da família, dos seus entes mais queridos, dos momentos felizes que viveram e que os desejavam ainda viver.A partida aconteceu de madrugada, de forma que estavam no local "de lançamento" ainda de noite.


O avanço iniciou-se com a secção de GE's à frente, logo seguida pelo Alferes A...... e o seu Grupo de Combate - o 1.º. Seguia-se depois o 4.º Grupo de Combate.A aproximação foi feita com todos os cuidados. Seria aquela talvez a primeira vez que o faziam. Caminharam sempre pela orla das florestas e sempre que era necessário atravessar campos abertos, faziam-no praticamente rastejando.Ao anoitecer, chegaram a uma pequena colina, suficientemente arborizada para permitir que não fossem detectados, que o guia informou estar perto do acampamento. O guia em questão havia permanecido durante toda a sua vida naquele acampamento, tinha desertado e aceitou guiar as NT, a troco da promessa que trariam a sua família sã e salva.O Alferes A.... resolveu passar a noite nessa colina.


Quando da aproximação foram inúmeros os sinais de que se tratava de uma região habitada por uma expensa população, comprovada pelas inúmeras "lavras" por onde iam passando.Depois de comerem a habitual ração do combate, procuram descansar um pouco.


O Alferes havia decidido que só atacariam de madrugada já que poderia haver feridos e, durante a noite, a Força Aérea não fazia evacuações...


O Furriel Al.... sentiu necessidade de cagar. Depois de falar com o Alferes lá se afastou um pouco do perímetro do acampamento improvisado, mas o receio do perigo de que todos tinham consciência, não favoreceu que ele se afastasse muito dos restantes camaradas, de tal forma que o Cabo M..... sorrindo comentou para o Alferes "meu Alferes, a merda do Furriel cheira mesmo mal"....


Ao contrário do que normalmente acontecia noutras operações, O Alferes acabou mesmo por adormecer. Foi acordado pelo Chefe de Secção dos GE's que o chamou suavemente: "Meu Alferes está na hora. Temos de ir".

O Alferes procurou ver as horas e viu que pouco mais passava da meia-noite. A primeira reacção foi de que era cedo, que só queria atacar ao amanhecer. O Geremias, assim se chamava o Chefe de secção, voltou a recomendar que avançassem já porque não se sabia bem, quanto tempo demorariam.


Iniciaram a marcha por volta da uma hora da manhã. Foram atravessando "lavras" e pequenos ribeiros, sem que se sentisse o mais ligeiro sinal de "guerilheiros". A travessia dos riachos, levantava algumas dificuldades ao alferes cuja altura deficultava o equilibrio, principalmente quando tinha de utilizar arvores caídas para atravessar. Já muito perto do acampamento, teve a pouca sorte de cair mesmo de uma àrvore que tentava utilizar com ponte. A queda foi de tal forma desastrosa que o Geremias sussurrou "filho da puta, não faz barulho". Penso que nunca ninguém soube que tinha sido o Alferes a cair...


O Alferes, sempre com a mão no Guia, não fosse ele arrepender-se e fugir, ia ouvindo o que ele dizia: Um espaço aberto era a Igreja. " Alferes, aqui é a escola". Tratava-se de um espaço aberto com árvores colocadas paralelamente onde os alunos se sentavam. À frente havia uma espécie de mesa construída por ramos de árvores.


Nesta altura, deveriam ser quatro horas da manhã, o Alferes sentiu uma espécie de alívio. Não se sentia o mais pequeno ruído. Nem de cães a ladrar nem de galos a cantar, o que acontecia sempre noutras operações que haviam realizado. Talvez "eles" tivessem saido dali. Talvez tivessem abandonado o acampamento..."


O Alferes tinha decidido que só haveria tiros se fosse necessário. Tinha combinado com o Geremias que iriam de cubata em cubata, recolheriam as populações, começando pelos familiares do Guia. Prucurariam depois saber onde se encontravam os guerrilheiros com armas para que fossem "neutralizados"... Acontece que uma lanterna que o Alferes havia levado para facilitar a aproximação, fundiu, o que impediu que esse objectivo fosse levado a cabo. Por outro lado, aumentou o receio de que, na escuridão quase total provocada pelas árvores enormes que impediam que o acampamento fosse visto nas observações aéreas que regularmente faziam, fizessem despoletar qualquer mina anti-pessoal colocada nos trilhos.


Já próximo do acampamento o Alferes decidiu que o assalto seria feito pela Secção de GE's e pelo 4.º Grupo. O 1.º Grupo ficaria a guardar o equipamento não utilizado no assalto e faria a protecção à rectaguarda .Aqui ficaria tambem o morteiro sessenta. Ele próprio comandaria o assalto.


A aproximação continuou cada vez com cuidados acrescidos e com a Alferes cada vez mais esperançado que o acampamente estivesse abandonado.Passados uns momentos começaram a ouvir pessoas a tussir. "Estamos fudidos" desabafou o Alferes "eles estão mesmo cá". As noites eram frias o que conjugado com a ausência de medicamentos, fazia com que houvesse pessoas doentes e que tossiam com aquele som cavernoso, tipico das pessoas que sofrem de tuberculose.


Quase imediatamente, começaram os tiros, primeiro das pistolas metralhadoras utilizadas pelos guerrilheiros caracterizadas por terem um som mais seco e breve e depois a resposta principalmento dos GE's e dos camaradas do Grupo de Combate com as suas FN e G3.

O que se seguiu foi indiscritível. Nunca nenhum deles tinha ouvido um barulho tão intenso provocado principalmente por mulheres e crianças gritando ao fugir.O Alferes viu um tanto admirado que se encontrava praticamente no meio do acampamento.

O soldado S.... que seguia imediatamente atrás do Aferes, disparou todos os carregadores da G3 que levava consigo. Claro que os não recuperou na retirada...


O pessoal do 1.º Grupo, verificando que o Grupo de Assalto estava sobre fogo inimigo, começou a bombardear a zona com o morteiro sessenta. As granadas caíam próximo do Grupo de Assalto com o estrondo característico da deflagração das granadas quando rebentam próximas e aquelas caíam excessivamente perto, embora na direcção para onde os ocupantes do acampamento haviam fugido. Na fuga passaram muito perto do Furriel S.... que não abriu fogo, com receio de atingir os camaradas do Grupo de Assalto.


O receio de serem atingidos pelas granadas de morteiro que continuavam a cair, fez com que o Alferes decidisse a retirada imediata. Tambem já tinham a prova de que lá tinham ido... e a prova eram 5 crianças, extremamente lindas embora com sinais de subnutrição e dois adultos familiares do Guia.


Antes de retirarem lançaram fogo a várias cubatas.As crianças ou estavam nuas ou cobertas com uma espécie de tecido fabricado com pasta de caule de embomdeiro que, depois de comprimida, permitia fazer aquela espécie de tecido.


A rapidez da retirada fez com que os soldados se revezassem no transporte das crianças. O Soldado Vaz, apesar do seu aspecto frágil, transportou sempre durante a retirada a mesma criança, dando sinais de um estoicismos invulgar.


Chegaram ao lugar onde deviam ser recolhidas numas escassas três horas, percorrendo o que antes havia demorado mais de um dia a fazer.


Chegados ao local de recolha, o esgotamento era total. Cada um deles procurou uma sombra e descansou.


As viaturas que fariam a recolha, chegaram cerca de uma hora depois. Juntamente com as viaturas militares vinha uma camioneta conduzida pela Capataz da Fazenda do Quixico. Foram todos acolhidos como heróis. O Alferes perguntou aos furrieis que o acompanharam na operação, se o pessoal estava todo e tendo obtido a confirmação, ordenou o regresso ao quartel.


O Alferres A.... já no Quixico, tinha feito a barba e tomado banho, quando o Cabo que servia na messe dos Oficiais o abordou aos gritos "meu Alferes" o "Piriquito" apareceu no Lué..." . O Piriquito era um dos padeiros da Companhia e que tambem havia participado na Operação.


O Piriquito contou depois o que lhe tinha acontecido: "Meu Alferes, quando chegamos ao lugar da recolha, deitei-me à sombra de um espinheiro e adormeci". "Quando acordei e vi que estava sózinho, olhei os sinais das rodas dos carros e comecei a correr no mesmo sentido". "Tinha corrido cerca de três kilómetros, quando vi que na picada e em sentido contrário ao meu, vinha uma manada de elefantes". Tive tanto medo que larguei tudo menos a arma e comecei a correr em sentido contrário".

Foi a sua sorte, se não tivesse acontecido isso, teria de ter corrido 30 kilómetros até atingir o Quixico. Assim bastou-lhe correr 15 Kilómetros para chegar ao Lué.


As crianças e adultos recuperados foram instalados na povoação de Nambuangongo. Uma das crianças era filha de um conhecido Chefe da Guerrilha no Norte de Angola.


Cerca de uma semana depois o Alferes A.... e o resto da Companhia foram transferido para o Sul de Angola para o merecido descanso, longe da guerrilha que caracterizava a zona dos Dembos.


Nota: trata-se da descrição exacta do que se passou numa operação realizada algures na Região de Nambuangongo, pelos 1º e 4º grupos de Combate da C. Caç 3482. A operação foi comandada pelos Alferes Ab...... nela participaram tambem o Furriel Sa....., o Furriel Al..... e o Furriel So......


Os dois Grupos com a secção de GE's seriam cerca de 40 companheiros.

Para todos eles um grande abraço de saudade do Alferes Ab......, 36 anos depois.....